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Opinião: "Abrigados" de Rui Marcelino


"Abrigados"

de Rui Marcelino

Bem vindos leitores a mais uma opinião. Há pouco tempo falámos-vos do livro "Trilhos de uma vida" do autor Rui Marcelino, recordam-se?

Se não viram cliquem AQUI.

Pois bem, dissemos-vos nessa opinião que tínhamos ficado curiosos com o desenrolar da história que o autor nos apresentou e que queríamos saber os destinos das personagens. Também vos dissemos que já tínhamos o segundo livro, certo? Pois é. Já o lemos e hoje trazemos a nossa opinião.

Se bem se recordam a nossa crítica ao primeiro livro prendeu-se com a estrutura do texto, dissemos que o mesmo era denso e que não tinha muitos diálogos a quebrar a monotonia. Bem, pegámos no segundo volume e fomos lendo, não seria de esperar outra coisa que não uma inevitável comparação entre os dois volumes. Por muito que nos tenhamos tentado abstrair tornou-se, como dissemos, inevitável que assim fosse.

Devemos ser honestos, como tentamos ser sempre, este segundo volume é ainda mais denso que o primeiro. Em termos físicos parece mais pequeno, tem 309 páginas, mas muito devido à paginação, já lá iremos.

A realidade é que este segundo volume conseguiu ter ainda menos diálogos que o primeiro, é certo que isto é a nossa posição e já o autor tinha editado os dois livros antes de nós mesmos lermos, sequer, o primeiro. Mas não podemos deixar de o dizer.

Afirmámos que no primeiro livro o autor deu muitos pormenores em determinadas alturas, bem, neste segundo deu o dobro. Daí a nossa leitura mais demorada, mais dez dias que o anterior. Foi uma leitura que não raras vezes se tornou cansativa, não tanto pela extensão das linhas mas pelo conteúdo. Uma boa parte do livro é passada a ler as viagens turísticas de dois personagens, com descrições dos locais e monumentos portugueses. Sinceramente, parecia que estávamos a ler um roteiro turístico ou um livro histórico.

Estas passagens turísticas afastaram o autor da história central. Percebemos a ideia, a personagem principal quis mostrar Portugal a outra personagem, La Dame, que chegara de França, quis encantá-la e tentar convencê-la a ficar mas, quanto a nós, exagerou.

Relembramos-vos que Álvaro, personagem principal, havia sofrido nova contrariedade no final do primeiro volume, o que sucedeu em seguida passou para o início do segundo livro e aqui o autor esteve bem. Claro que há aqui muito romance, mas que encaixou bem na narrativa.

A sorte acompanhou sempre os personagens deste livro, não fosse uma ou outra questão do personagem principal. Não há viragens extraordinárias na trama, tudo corre em velocidade cruzeiro e de feição.

Devemos dizer com sinceridade que esperávamos mais dos destinos dos personagens secundários, destinos que tínhamos curiosidade em conhecer. Apenas adiantamos que estes livros tratam essencialmente da temática dos sem-abrigo e que Ministro, de quem havíamos falado na anterior opinião, projectou algo que concretizará para ajudar a tornar os sem-abrigo em "abrigados".

O autor deu-nos várias páginas finais de histórias de vários sem-abrigos que chegaram ao conhecimento de Ministro, mas ficámos com aquela sensação de que faltava uma ligação entre esses personagens e a história, faltou ali qualquer coisa. Dizemos que, talvez, devesse o autor ter concentrado energias nesses personagens e tê-los indo introduzido na trama e no projecto de Ministro em vez de nos ter levado pela viagem turística de Álvaro. Mas isto somos nós.

Soube-nos a pouco o destino das personagens secundárias. A sua narrativa foi deixada para as últimas páginas e pareceu-nos algo rápida a sua contagem.

No entanto, no geral, não podemos dizer que não tenha havido coesão, porque a houve. O autor pegou na história e não deixou pontas soltas. Também devemos salientar que o autor tem uma escrita correcta e que - alertamos - quem não estiver habituado a ler deverá fazer-se acompanhar de um dicionário. Porquê? Porque o autor não tem uma escrita simples, ou seja, contrariamente à maioria dos autores portugueses, Rui Marcelino tem uma escrita rica em sinónimos, verbos, etc. Podemos dizer que aprendemos algumas palavras com ele.

É sempre difícil criticar/opinar um livro, pois quem os lê habitualmente apenas diz se gosta ou se não gosta. E nós não nos bastamos com isso. Queremos ir mais além. Pelo que, já sabem, nunca irão ler por aqui uma opinião apenas a dizer se gostámos ou não.

O cômputo geral é satisfatório, não odiámos o livro e também não desgostámos.

É notória a forma vincada de escrever do autor. Tem um traço muito próprio de escrita, o que é bom.

Mas há mais a dizer, quando a editora Sana nos sugeriu este livro falou-nos da sua capa. Na altura olhámos para ela e não percebemos o porquê do entusiasmo. Somos sinceros. E devemos dizer que só depois de ler o primeiro livro é que a mesma faz sentido. E agora temos um olhar diferente sobre o seu simbolismo.

Não só porque foi pintada à mão - óleo sobre tela - mas porque a mesma conta a história dos livros, o que devemos dizer, foi bem conseguido. E olhem que não temos grande olho para a pintura.

Depois achámos muito original o facto de as páginas (por fora), quando o livro está fechado, serem verdes. É o único da nossa estante assim. É um pormenor engraçado.

Para terminar temos mais duas coisas a dizer, a primeira tem a ver com a estrutura dada ao livro. Quando o abrimos a primeira vez vimos logo que era diferente, fez-nos confusão. Não só o tipo de letra é diferente do habitual, como as margens são imensamente reduzidas. Não sabemos se gostámos desse facto, das margens, pois faz com que haja a sensação de que cada página tem texto a mais, o que psicologicamente nos cansa. Talvez o efeito visual não seja o mais desejado, pois o subconsciente pode revolver-se. Pelo menos para quem lê com regularidade.

Mas de resto o livro tem uma paginação própria e agradável. Há cuidado.

O último ponto de que queremos falar é sobre algo que nos fez muita confusão. É algo que não está propriamente errado, mas de que não gostamos pessoalmente. Não sabemos se há mais alguém assim. E é a única coisa onde o autor não foi coeso.

No primeiro livro o autor escrevia de forma impessoal, ou seja, quando narrava e se referia a um personagem dizia "Álvaro olhou para...", neste segundo livro escreveu "o Álvaro olhou para...". Não gostámos nada. Dêmos por nós a suprimir os "a" e "o". Gostamos mais do distanciamento com que os autores falam, dá uma sensação de isenção e permite ao leitor manter a distância, ou seja, manter-se enquanto leitor externo. Não sabemos se nos explicámos bem. Mas notámos esta diferença entre as narrativas e aí o segundo volume perdeu algum encanto.

Terminando, agora sim, para aqueles que são sensíveis às causas sociais têm aqui uma história que deverão ler. É um romance simples no geral, embora com uma linguagem cuidada. Para quem gosta de ler descrições pormenorizadas não deixará certamente de agarrar este livro. É um livro cheio de amizade, com ideais e projectos que seriam bem vindos na nossa sociedade.

Sabemos que a nossa crítica vai sempre um pouco mais além, como dissemos, mas está aqui uma bela história, até hoje não havíamos lido nada com este tema. Uma boa aposta da editora. Apesar das arestas que limávamos.

P.S.: Álvaro, depois de privar com o Papa Bento XVI, vai encontrar-se com o Papa Francisco.

Não percam!

Classificação:

- Escrita: 8

- História: 8

- Revisão do texto: 9

- Complexidade: 8

- Trabalho gráfico: 8,6

Total: 8,32

0 - Péssimo

1 a 3- Muito Mau

4 a 5- Mau

6 a 7- Satisfatório

8- Bom

9 - Muito Bom

10 - Excelente!

Mais informações em: Sana Editora

Sinopse

Letras, Ministro e La Dame são apelidos que resultaram das vivências passadas de algumas personagens deste romance. Têm um novo caminho a percorrer até à condição de abrigados. Vidas desafiantes e aventureiras que nos mostram que, após o inesperado final do Trilhos de uma Vida, as suas histórias podem continuar. Cronologia intensa, a do protagonista Álvaro Meireles, demonstrando uma confiança e entrega totais, ao longo de uma grande e magnífica aventura, percorrendo grande parte do globo terrestre.

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