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À conversa com o autor António Bizarro


À conversa com...

António Bizarro

António Bizarro é um escritor e músico nascido no Brasil, em São Paulo, e que veio para Portugal, mais exactamente para o Barreiro, com um ano de idade. Por isso, e como disse outro escritor acerca de outra cidade, o Barreiro é a sua «capital da memória», além de fonte de inspiração e cenário de fundo para as suas histórias.


Livros de Vidro - Como surgiu a escrita na sua vida?

Surgiu com a leitura e com a música. Tive a sorte de crescer numa casa com livros e leitores, e desde cedo, praticamente desde que aprendi a ler, comecei a devorar livros de todos os géneros. Mais tarde, na adolescência, a música começou a ocupar um lugar cada vez mais importante na minha vida, o que me levou a querer aprender a tocar guitarra e a escrever letras. Apesar de nunca se terem tornado canções, essas letras despertaram-me o gosto pela escrita e os textos foram gradualmente tornando-se maiores e mais narrativos. Julgo que a escrita também foi motivada pelo desejo de emular os meus ídolos, pela minha tendência de sonhar acordado e imaginar cenários elaborados, e a imodéstia de pensar, ao ler certos livros, que se fosse eu o autor, teria escrito a história de outra maneira.

Livros de Vidro - Conheço o seu trabalho “O Motor do Caos e da Destruição”. Todos os seus livros são dentro deste género? Fale-nos do que gosta de escrever.

Sim, quase todos. O meu género de eleição é o conto, a história curta, mais cultivada nos países anglo-saxónicos, embora tenham existido contistas exímios de outras paragens, como Borges ou Tchekhov. “O Motor do Caos e da Destruição”, em conjunto com “O Longo Caminho de Regresso” e “O Desejo e Outros Demónios”, é o resultado de cerca de cinco anos de produção intensiva, em que fui criando o meu universo ficcional, situando as histórias na cidade fictícia de Saint Paul, criando ligações entre contos, e até utilizando, aqui e ali, as mesmas personagens. Cada livro tem doze histórias, agrupadas mais ou menos por temática, e apesar de terem um princípio, meio e fim, pode-se dizer que todas elas estão ligadas e que, no fundo, estou a escrever uma espécie de romance em mosaicos (termo que tomei de empréstimo de João Barreiros e Luís Filipe Silva, autores do livro “Terrarium”.) Já o livro “O Invisível, a sua Sombra e o seu Reflexo”, considero-o mais uma antologia, já que reúne contos que fui publicando no meu blogue, Android:Apocalipse, três histórias do meu primeiro livro, “Siamese Dream”, as quais foram reescritas e integradas no universo Saint Paul, e ainda duas histórias inéditas. A novela “The Exterminating Angel”, que será publicada futuramente em português através da Coolbooks, foi também retirada do meu primeiro livro e reescrita e integrada no mesmo universo. O conjunto da minha obra forma aquilo a que chamei de série Cidade da Indústria.

Livros de Vidro - Onde vai buscar a sua inspiração para a escrita? Como cria os seus enredos?

A inspiração vem de muitos lados, desde notícias de jornal, curiosidades científicas que me fazem pensar e relacioná-las com outras ideias, certos episódios da minha própria vida ou de que fui testemunha e, com muita frequência até, de canções que me prendem e me obrigam a escutá-las obsessivamente e a imaginar cenários, cenas e personagens cada vez mais detalhados a cada nova audição. No caso do “The Exterminating Angel”, por exemplo, o catalizador foi uma canção dos The Creatures (uma banda inglesa liderada pela Siouxsie Sioux, dos Siouxsie And The Banshees), intitulada precisamente “Exterminating Angel”.

Livros de Vidro - Como definiria o seu estilo de escrita?

Diria que o meu estilo de escrita é urbano e industrial, ou pós-industrial, muito influenciado pela cidade onde cresci, o Barreiro, uma cidade que viveu sempre muito à volta das fábricas que muito emprego deram a barreirenses e a forasteiros. A meio dos anos 80, o tecido industrial do Barreiro já estava em decadência, a cidade tornou-se cada vez mais um gigantesco dormitório, ainda havia muita poluição, muito cinzento por toda a parte, e uma sensação de claustrofobia e estagnação permeava as vidas das pessoas. Tudo isso, juntamente com a música industrial, o meu estilo musical favorito, acabou por formar o da cidade de Saint Paul e dos seus habitantes. Gosto de escrever (e de ler) histórias que contenham um qualquer elemento de estranheza, daí que eu tenha o hábito de ir buscar elementos típicos da Ficção Especulativa, seja da ficção científica ou do horror (da fantasia, nem tanto), mas também do policial e do . De mim para mim, rotulei a minha escrita de Ficção Industrial.

Livros de Vidro - Com que escritor se identifica?

São vários os escritores com que me identifico, em termos de estética. Dos que me infuenciaram, e foram muitos, destacaria o Edgar Allan Poe, o J.G. Ballard, o H.P. Lovecraft e o Philip K. Dick, todos eles grandes cultores da .

Livros de Vidro - Pondera arriscar noutro género literário?

Por enquanto, não. Quem me convenceu de que o conto seria o meu género de eleição foi Jorge Luís Borges, contista, poeta e ensaísta; segundo ele, e estou a parafrasear livremente, espraiar por quinhentas páginas uma história que pode ser contada em poucos minutos é um desperdício de tempo. Isso não quer dizer que não leia ou aprecie romances, ou que já não tenha lido muitos «calhamaços», simplesmente (ainda) não tenho nem fôlego nem paciência para escrever obras extensas. Além do mais, tenho conseguido explorar outros géneros dentro do meu universo ficcional, nomeadamente ensaio, poesia, crónica e até mesmo letras de música, atribuindo essas incursões em géneros diferentes a personagens criadas por mim. Outro artifício a que recorro com alguma frequência é citar excertos de livros imaginários, que só «existem» em Saint Paul, algo que Borges e Lovecraft costumavam fazer.

Livros de Vidro - Há mais livros para sair da gaveta? Se sim, dentro do mesmo estilo? O que nos pode contar?

O meu próximo lançamento será “O Anjo Exterminador”, a versão portuguesa do “The Exterminating Angel”, através da Coolbooks. O que este livro tem de diferente, para além de ser uma única história ao invés de um conjunto de histórias, é que será enriquecido por ilustrações da autoria do Sérgio Aranha, também ele um artista barreirense, o qual tem sido o responsável pelas capas dos álbuns de música electrónica que tenho lançado pela Enough Records Netlabel. Tenho também terminado e pronto a publicar uma espécie de romance que, na verdade, são três histórias independentes que se entrecruzam, também elas situadas no universo Saint Paul.

Livros de Vidro - Como se sentiu ao ver o seu livro alvo de opinião no blogue?

Fiquei contente. Fico sempre contente quando alguém se dá ao trabalho de ler um livro meu e de exprimir a sua opinião acerca dele. Ajuda-me a ter uma perspectiva diferente do meu trabalho, em especial porque vem de alguém que não me conhece pessoalmente e que, por isso, é mais propensa a fazer uma apreciação objectiva e sincera.

Livros de Vidro - Como lida com a crítica aos seus livros?

Lido bem. Até agora não tive muitas críticas negativas, e as que tive não me pareceram motivadas por maldade, nem as tomei como um ataque pessoal; e são sempre uma oportunidade para pensar sobre o que escrevi e tentar melhorar a minha escrita. As críticas positivas deixam-me feliz, em especial, quando percebo que as ideias e as referências por trás das histórias foram claras para a pessoa que fez a crítica.

Livros de Vidro - Como têm sido recebidos os seus livros pelo público?

Quase todos os meus livros tiveram segundas tiragens, embora nunca sejam tiragens muito grandes, e tenho recebido reacções muito positivas por parte de alguns leitores. Infelizmente, em Portugal as pessoas ainda torcem muito o nariz ao conto enquanto género literário, o que é irónico; muita gente diz que não lê porque não tem tempo, porque não se consegue concentrar ou porque os livros são muito caros, logo, os livros de contos seriam os livros perfeitos para essas pessoas! As próprias editoras também não apostam muito no género, porque acham que não vende, falhando assim naquilo que eu acho que deve ser a função de um agente cultural: em termos económicos, criar a procura oferecendo produtos diferentes, não apenas aquilo que o público acha que quer só porque não conhece mais nada. Essa foi uma das razões que me levou a mandar traduzir “O Anjo Exterminador” para inglês; é uma tentativa de encontrar públicos mais receptivos e habituados ao género. Honra seja feita à Coolbooks que não só apostou nos meus livros e outros livros de contos, como no próprio conto enquanto género, tendo publicado vários desde o começo.

Livros de Vidro - Onde podemos adquirir os seus livros?

Os meus livros podem ser adquiridos a partir da página da Coolbooks ou encomendando directamente na WOOK. Quanto a livrarias, em Lisboa podem encontrá-los na Almedina, na Bertrand (por encomenda), Ler Devagar – Lx Factory, Livraria Ler, Livraria Férin, Livraria Barata, Poesia Incompleta, Menina e Moça, Leituria e Universidade Católica Portuguesa. Há uma lista mais completa no site da Coolbooks, que inclui livrarias noutros pontos do país. Quanto ao “The Exterminating Angel”, está disponível no site da Amazon, tanto em e-book como em paperback. Podem também contactar-me através do Facebook e adquirir um exemplar autografado de qualquer um dos meus livros.

Livros de Vidro - Por fim, quer deixar alguma mensagem a quem segue o blogue e que possa estar curioso para ler os seus livros?

Se gostam de contos, em especial, de contos com elementos bizarros e situados num mundo estranho que se vai tornando cada vez mais familiar, talvez os meus livros sejam o que procuram. No site da Coolbooks podem ler a primeira história de cada um dos meus livros e ter uma ideia do que vos espera em Saint Paul.

Deixo, desde já, o meu agradecimento ao autor pela confiança e disponibilidade.

Os livros do autor:

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